De olho no aquecimento global

Ao mostrar que o calor exagerado, as enchentes e as secas podem ser obra do tão falado efeito estufa, você desperta a atenção da turma para a poluição, que está destruindo o planeta

Mesmo vivendo num país tropical, a maioria dos brasileiros se preparou para este verão com certa cautela ao se lembrar de 2004. No ano passado, a estação mais quente do ano surpreendeu a todos com temperaturas baixas no Sudeste, secas no Sul e enchentes no Nordeste. Meses antes, os europeus haviam enfrentado um calor recorde, que matou milhares de pessoas, e, na Ásia, chuvas torrenciais deixaram milhares de vítimas. A ciência diz que alguns fenômenos naturais, como flutuações periódicas do brilho solar ou erupções vulcânicas têm efeito temporário sobre o clima. Mas há fortes indícios, afirmam cientistas, de que o clima está mudando mesmo por causa do crescente aquecimento global. 
Se de um lado temos de enfrentar as conseqüências ameaçadoras desse aquecimento, de outro convivemos agradavelmente no nosso dia-a-dia com suas potenciais causas. Afinal, nós andamos de carro, ônibus ou avião, que consomem combustíveis. Petróleo também foi queimado para produzir o telefone, o computador, o aparelho de TV ou de som que usamos diariamente. Assim, direta ou indiretamente, colaboramos para o aumento da emissão de gases poluentes, que aceleram o chamado efeito estufa (
veja infográfico). 

Pequenas forças que causam mudanças 

A equipe do pesquisador James Hansen, da Nasa, a agência espacial norte-americana, calculou que a temperatura da Terra aumentou na proporção de quase 2 watts por metro quadrado. Sabendo que uma pequena lâmpada de árvore de Natal consome cerca de 1 watt, escreveu Hansen na revista Scientific American, podemos imaginar que o aquecimento global equivale à colocação de duas dessas lampadazinhas sobre cada metro quadrado da superfície terrestre, acesas dia e noite, gerando um calor quase imperceptível. Mas, advertiu ele, a história do clima terrestre revela que pequenas forças, mantidas por longo tempo, podem causar grandes mudanças climáticas. 

Não foi por acaso que esquentaram as discussões sobre o aquecimento global: na última década, uma média de 210 milhões de pessoas por ano foram vítimas de catástrofes causadas por fenômenos naturais associados ao clima, como ondas de calor, enchentes, incêndios florestais, furacões, tornados e ciclones, revelou a Organização Meteorológica Mundial. O prejuízo anual causado por esses desastres chegou perto de 40 bilhões de dólares, e 98% da população atingida vive em países em desenvolvimento. 

Os perigos do aumento da temperatura 

Ainda há muitas divergências sobre as previsões de transformação do clima e as causas do aquecimento global, mas alguns números merecem destaque. Dados do Painel Intergovernamental sobre Mudança Climática (IPCC), da Organização das Nações Unidas (ONU), mostram que a temperatura global aumentou em média 0,6 grau Celsius ao longo do século 20 e que a maior parte desse aumento, 0,5 grau, ocorreu após 1950, sendo que os anos 1990 foram os mais quentes de toda a história. 

As projeções do IPCC indicam que até o ano 2100 a temperatura da Terra poderá esquentar entre 1,4 e 5,8 graus Celsius. Dependendo do ritmo e da intensidade com que isso ocorrer, revelam as estimativas, dentro de décadas ou séculos pode haver o derretimento gradual das calotas polares. Em conseqüência, o nível do mar se elevará, fazendo submergir ilhas e colocando em risco a população das zonas costeiras dos continentes, incluindo a das grandes cidades. Com o planeta mais aquecido, prevê o IPCC, grandes alterações climáticas se tornarão mais freqüentes. Mudanças nos padrões de secas e chuvas acarretarão graves prejuízos para a agricultura; algumas áreas de preservação ambiental entrarão em colapso e crescerão os riscos de disseminação de epidemias em escala mundial. 

Solução pode começar com o Protocolo de Kyoto 

Em vista de tantos riscos, partiram da ONU propostas para estabilizar a composição atmosférica sem causar um colapso na economia global. Uma delas é o Protocolo de Kyoto, assinado no Japão em 1997, que entra em vigor neste mês. O tratado prevê a diminuição de 5,2%, entre 2008 e 2012, no lançamento dos gases causadores do efeito estufa na atmosfera. Foi decidido que o documento só viraria lei depois que fosse aprovado por 55 países, contanto que entre eles estivessem os responsáveis por pelo menos 55% da emissão total de carbono na atmosfera global. Esse índice foi ultrapassado e atingiu 61,6% em outubro, com a adesão da Rússia – que sozinha responde por 17,4% da poluição mundial. 

Já os Estados Unidos - estima-se que venha de lá cerca de 30% de todos os poluentes lançados na atmosfera - não assinaram o protocolo, alegando que a adaptação de suas empresas às normas ambientais resultaria em altos índices de desemprego e que preferem tentar convencer as indústrias poluidoras a adotar novas tecnologias. "Sem a participação dos Estados Unidos, o protocolo fica enfraquecido e seu impacto será mais político do que prático", avalia José William Vesentini, professor de Geografia da Universidade de São Paulo. Para ele, é possível que o país só assuma esse compromisso quando puder substituir o petróleo por outro combustível. 

Teme-se que mesmo países desenvolvidos que assinaram o acordo, como a Alemanha, não consigam cumprir as metas mínimas de controle ambiental previstas para até 2012. Nesse ano, entra em vigor uma nova fase do tratado, que atinge os países em desenvolvimento. O Brasil poderá então ser pressionado em virtude do desflorestamento da Amazônia, que já é responsável por 3% de todos os gases-estufa emitidos. A China, por sua vez, deverá responder pela poluição industrial, que afeta seriamente suas cidades. Brasil e China já se articularam em defesa do Protocolo de Kyoto. 

Uso de energia não-poluidora é tendência 

Em todos os países, é importante poupar energia. Isso inclui desligar a luz, fechar rapidamente a porta da geladeira e até optar sempre que possível pelo transporte coletivo. Também é necessário recuperar áreas degradadas: o tratamento do lixo e do esgoto, além de evitar a poluição do solo e dos rios, evita a concentração de metano na atmosfera. Outra idéia é baratear o uso, na indústria e nos serviços, de energia limpa – a que não causa impacto no ambiente para ser produzida ou consumida. Nas próximas décadas, diz Vesentini, a tendência é diversificar as fontes de energia: biocombustível (feito de álcool, mamona, babaçu etc.) para os veículos, talvez de início misturados ao óleo diesel e, depois, puro; para usinas de eletricidade, energia solar ou das marés. 

Uma experiência desse tipo, relata o professor, já está sendo implantada na Alemanha, onde o governo isenta de impostos consumidores que utilizam energia solar em casa. As sobras do consumo doméstico vão para as correntes públicas de energia e os donos das residências são pagos por isso. 

Segundo o professor de Química Roosevelt K. Fujikawa, de São Paulo, indústrias automobilísticas, prevendo o esgotamento do petróleo, vêm desenvolvendo uma alternativa limpa. “Células de combustível – uma espécie de pilha – geram eletricidade pela reação química entre o gás hidrogênio e o oxigênio do ar”, explica. O automóvel é movido por um motor elétrico que tem como produto apenas a água.

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