Socorro aos bancos

Reuters

Desde que os primeiros sintomas da crise financeira internacional começaram a aparecer, ainda em 2007, os governos de vários países tiveram que colocar a mão no bolso para evitar uma quebradeira no sistema bancário. O grito de socorro das instituições financeiras foi atendido com intervenções do estado em bancos considerados símbolos do capitalismo. Injeções de dinheiro público no capital privado têm sido a solução adotada por muitas nações atingidas pela crise, como os Estados Unidos e países da União Européia, para evitar maiores estragos. Para explicar algumas questões em torno desse assunto, VEJA.com ouviu dois especialistas. Na visão do professor Haroldo Mota, da Fundação Dom Cabral, o mundo presencia a estatização dos bancos em países onde o neoliberalismo era, até bem pouco tempo atrás, uma doutrina inquestionável. Na opinião do professor Evaldo Alvez, da Escola de Administração da Fundação Getúlio Vargas (FGV), a crise é o resultado da transformação por qual passa o sistema produtivo, e essas medidas são apenas paliativas.

1. O que essas operações de injeção de dinheiro do estado significam de fato?

Na prática, está havendo uma estatização das instituições financeiras, principalmente das americanas e européias, segundo opinião do professor Haroldo Mota. A operação é simples: pega-se dinheiro do Tesouro e compra-se ações do banco no valor da dívida. A cada ajuda por troca de ações, o estado vai ficando cada vez mais pesado.


2. Isso resolve o problema?

A curto prazo, sim. Mas segundo o professor Evaldo Alves, é necessário atacar a causa da crise, que é a falência do atual sistema produtivo. Conforme o professor, a cada 40 ou 50 anos o mundo muda o seu sistema produtivo em função do avanço da tecnologia. Assim como ocorreu na virada dos anos 1920 para os 1930, quando o mundo abandonava a produção baseada no vapor e entrava no sistema eletromecânico, agora vive-se a entrada na era da tecnologia de ponta, da bioeletrônica, da nanotecnologia.


3. E por que os bancos são o principal alvo dessas ajudas?

O papel do banco é dar liquidez e financiar a produção. Não foi isso o que aconteceu nos Estados Unidos, segundo Alves. Para ele, o banco virou ferramenta de especulação naquele país, cuja produtividade vinha caindo nos últimos anos enquanto o consumo aumentava e as pessoas não se preocuparam em poupar.


4. Essa participação do estado na iniciativa privada é temporária?

Nos Estados Unidos, espera-se que as ações voltem para as mãos da iniciativa privada e para os pequenos poupadores. De acordo com Mota, passada a crise o Tesouro americano deverá ir ao mercado e vender os papéis ao público comum. Na Europa ainda não se cogita essa possibilidade.


5. Quais são as conseqüências para os clientes e para as instituições que têm filiais aqui no Brasil?

Como temos um sistema bastante regulamentado, o Brasil passa a ser uma espécie de ilha para esses grandes bancos. A rígida legislação brasileira foi resultado de experiências negativas passadas na época da ciranda financeira. Para Mota, bancos internacionais que enfrentam problemas no exterior, como o HSBC e o Citibank, já demonstraram serem sólidos no Brasil.


6. Isso quer dizer que o Brasil vai passar ileso?

Pelo contrário. Na opinião de Alves, os sinais de redução da economia brasileira indicam que o Brasil não deverá passar incólume à crise financeira. O país, no entanto, tem boas razões para estar otimista em relação às ferramentas com que poderá combater os efeitos da tormenta.


7. Intervenções estatais desse tipo já aconteceram antes?

Sim. A mais conhecida é a crise originada com o Crash da Bolsa de Nova York, em 1929, quando o então presidente americano Franklin Delano Roosevelt criou o Federal Deposit Insurance Corporation (Fdic), que garante o depósito do pequeno investidor e até hoje é utilizado. Roosevelt também foi o arquiteto do New Deal, um programa do governo que deu ajuda aos desempregados, reformou as práticas de negócios e finanças e recuperou a economia americana (e, consequentemente, a mundial) durante a grande depressão.


8. Todas essas medidas ajudarão a resolver o problema de falta de crédito no mundo?

Conforme o professor Evaldo Alves, o mundo tem atualmente um excesso de liquidez que corresponde a pelo menos o dobro de todo o Produto Interno Bruto (PIB) mundial, que gira em torno de 58 trilhões de dólares. Ele prevê que em cerca de cinco meses os detentores de boa parcela desse dinheiro voltarão a investir, ainda que com muita cautela - afinal, acredita-se que a crise tenha ajudado a queimar quase 5 trilhões de dólares.

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